ALUMÃ
Sem açúcar
Sem piedade.
Entre os sonhos
Entre os intestinos.
Somente folhas
Fora dos dicionários
Ausente das medicinas.
Dos amargos da vida
Das ressacas do tempo
Dos sumos mais rançosos.
O fel dos soluços
O mel das receitas
O chá das tempestades.
O suco gástrico das manhãs
O visgo grosso da jaca
A pele fina da mangaba.
O cheiro leve da abricó
O afrodisíaco do cajá
E o enjôo do saputi.
A multiplicidade da Malacacheta
Os dois lados da lâmina
O perigo das encostas.
As surpresas do Cerrado
A sombra da Mata Atlântica.
O trincado da sola
O cheiro do couro da sola
O mesclado da cola.
A lama das estradas
O carro de boi.
As folhas do Chile
As sombras da Bahia
Os talos do Recife.
As raízes da restinga
As samambaias da noite
Os cavalos dos altiplanos.
O azeite do outono
As uvas do inverno
As laranjas da estufa
O temporão das águas.
O cume das montanhas
O estalo dos gravetos
A brasa do churrasco
A liberdade dos Pampas.
Os espinhos da Caatinga
O aluvião dos riachos
As pedras da corredeira
O reluzir dos átomos.
A rúcula fresca
A alface orvalhada
A tez da cebolinha
A alegria do cheiro da salsa.
Espantaram-se as folhas!
Evadiram-se os peixes
Aquietou-se a coruja
Calou-se o macuco.
O devir do poeta
As pétalas de fogo
Os rastros da neve.
Na sala dos jovens, o absinto
No quintal, a camiseta colorida
No depósito, a caixa de flores
Na feira, gritos de amores.
São folhas do ocaso
São relvas dos pântanos
São caules das palavras
São venenos das crises.
A gasolina expropriada
O tiner cheirado
A cola roubada
O futuro seqüestrado.
Abriu-se o mundo
Gerou-se o pranto
Secou-se o crisântemo
Fecharam-se os olhos.
Dormiu cedo a folha da Alumã
Secou cedo a sua amargura
Amenizou dores
E foi arrancada pelo homem.
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