Estávamos em Vitoria da Conquista, sudoeste da Bahia para a IV Conferência estadual de cultura e de repente ouço o anuncio da presença de Pedro Tierra, poeta brasileiro e atual secretário de cultura do distrito federal. Ele estava ali para uma mesa temática sobre a gestão da cultura no Brasil, sobretudo a partir da abertura democrática e das experiências dos governos de esquerda em administração pública. Nascido Hamilton Pereira, em julho, de 1948, em Porto Nacional, uma cidade com janelas olhando para o rio Tocantins. Nasceu miúdo, mas vingou. Viveu em seminários e prisões. Em seminários quando não tinha o uso da razão. Nas prisões, quando adquiriu.
Em site dos professores da PUC-SP, diz Hermann Schulz sobre Pedro Tierra: “Os primeiros manuscritos de Pedro Tierra chegaram à Europa em meados da década de setenta; foram-me oferecidos por um homem que até então eu desconhecia, chamado José Ferreira. Tencionavam, com a publicação dos poemas, arranjar recursos para o movimento de oposição no Brasil, escreveu-me Ferreira de Paris; e que o autor estava preso há três anos por motivos políticos, fora tarefa extremamente difícil conseguir que os textos saíssem clandestinamente da prisão.
No dia-a-dia de um editor, segue-se, às vezes, uma pista sem saber ao certo porquê; outras pistas são abandonadas sem motivo aparente, e se perdem para sempre. Este impulso proveniente do Brasil teve um impacto muito grande, seu rastro nunca se perdeu – até aos dias de hoje.”
Nosso Encontro
Estive com ele rapidamente e conversamos sobre os novos projetos e a sua poesia. Comentou sobre a luta entre vivenciar os desafios da administração pública no campo da cultura e os seus projetos de publicação dos livros. Falou de sua satisfação em estar na Bahia e da riqueza que é a diversidade das expressões culturais no estado. Não presenciei a sua palestra no grupo temático. Queria muito.
Parece que a conferência nem tenha consciência da honra e do privilegio de receber Pedro Tierra, lutador e poeta, realizador – junto com Martin Coplas e Pedro Casaldáliga – dos projetos musicais “Missa dos Quilombos” e “Missa das Terras Sem Males”, cantos de resistência profecia num Brasil em tempos de escuridão.
Celebrando este encontro, o Viola de Bolso relembra um poema de Pedro Tierra:
A Hora dos Ferreiros
Quando o sol ferir
com punhais de fogo
e forja
a exata hora dos ferreiros,
varrei o pó da oficina
e a mansidão dos terreiros,
libertai a alma dos bronzes
e dos meninos
desatada em som
e nessa aguda solidão
que em ondas se apazigua
ponta de espinho antigo –
na carne
do coração.
Convocai enxadas,
foices, forcados, facões,
grades, cutelos, machados,
afeitos ao rigor da terra
e da procura
e, por fim, as mãos,
resignadas,
multiplicadas no cereal maduro.
Mãos talhadas em silêncio
e ternura,
que plantam a cada dia
sementes de liberdade
e colhem ao fim da tarde
celeiros de escravidão.
Esgotou-se o tempo de semear
e inventou-se a hora do martelo.
Retorcei na bigorna outros anelos
e a força incandescente deste mar
de ferros levantados.
Esgotou-se o tempo de consentir
e pôs-se a andar
a multidão dos saqueados
contra os cercados do medo.
Homens de terra
e relâmpago!
Convertei em fuzis vossos arados,
armai com farpas e pontas
a paz de vossas espigas.
(P. Tierra).
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